E para esquecer ela foi escrever, mas ela não queria
rimar, só queria desabafar sobre qualquer coisa banal que a distraísse, que a
deixasse longe daquela rua em que se beijaram pela primeira vez, daquela praça
em que brigaram pela segunda vez e daquela página da internet que ela tinha
vasculhado pela terceira vez nos últimos vinte e dois minutos, só para saber se
ele havia compartilhado algum link inútil em que ela tentaria encontrar uma
relação entre o que aconteceu com eles.
Não
era um texto para ele, não era sobre ele, era sobre os seus desejos secretos,
seus prazeres ocultos, seus sonhos simplórios, seus pensamentos travessos, era
egocentrismo em palavras, era sobre ela e sobre o que ela mais queria naquele
momento, que ele cuidasse das suas cicatrizes.
Ela
se lembrou do dia em que rolou em uma descida e foi parar no hospital toda
ensanguentada, mas não ligou, porque tinha mais sangue no seu coração do que no
joelho que levava pontos na mesa de operação. Ficou uma cicatriz, seu joelho
nunca mais seria o mesmo, teria aquela marca escura, que a faria lembrar-se
daquele dia, como se lembraria de todos os seus amores, que deixaram cicatrizes em seu coração.
Muitos
garotos haviam marcado a sua vida, muitos amores desfeitos e muita torta de amora
para curar a bad. O último doía mais,
só porque ainda sangrava, mas logo ficaria só a marca do soco que levou no
peito.
Não
importa, há sempre um amigo para te levar para o hospital ou para ouvir seu
chororô sem sentido.
Ela
não queria ficar insistindo em assuntos amorosos que sempre levam a remorsos:
como deveria ter sido, como deveria ter feito, como deveria ter esquecido.
Desse jeito ia parecer uma menina chorona, deveria manter a sua fama de durona,
amores são descartáveis, usamos e jogamos fora, era como ela sempre dizia, mas não se convencia.
Percebeu
que não falava de coisas banais e que os sentimentos estavam sempre presentes,
aquele texto mais uma vez falou sobre o tal amor, o clichê que todo mundo
critica, mas todo mundo vive, compram balões coloridos e buquês gigantes e
caminham orgulhosos pelas metrópoles, atrapalhando os cidadãos que andam
apressados para logo chegarem em casa e encontrarem seus companheiros, para
contar sobre o dia e pegarem no sono abraçados com um leve sorriso de contentamento,
de bobo apaixonado.
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