"A NOSSA LINGUAGEM CRIA O MUNDO."

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

UM GOLE DE VERDADE

 

            História de bêbado é chata ou engraçada. Bêbado não tem meio termo, ele dorme no botequim ou quebra tudo de uma vez, tem aquele que quebra e dorme. A vida de um bêbado é empolgante, porque é uma rotina impulsiva, todo mundo faz de conta que não quer ser impulsivo, mas todo mundo fica bêbado.

           Bebi uma garrafa. Já dá para ser impulsiva? Eu nunca sei a hora certa e às vezes começo a ouvir minha vontade no primeiro copo. Lá vem a repressão: você não está tão bêbada para fazer isso. Eu não preciso estar sempre bêbada para quebrar coisas ou dormir na mesa do bar.

            Sempre tem alguém que manda você parar de beber e também tem alguém que manda você desligar o celular. O celular é uma bomba na mão de um bêbado. Ele liga chorando, brigando, implorando, cobrando a divida do irmão e a atenção do ex. Você tem que parar de beber ou desligar o celular.

            É quando surge o discurso de bêbado rejeitado. É quando ele se lembra do primeiro beijo e até da mãe o mandando comer brócolis. O brócolis o faz correr para o bidê. E o primeiro beijo também. O fígado sente as dores do coração e do arrependimento do dia seguinte.

           Estou na quinta garrafa. Já posso dizer que peguei o seu melhor amigo quando você chegou atrasado à festa da Julia? Eu já estava bêbada, eu só bebi bastante porque você se atrasou, mas não foi sua culpa, você sempre esteve atrasado, lembra quando te amei adiantado?

            Já bebemos bastante, amanhã podemos dizer que não nos lembramos de nada por causa da cachaça. Vamos de saideira?


(O traído começa a quebrar garrafas)
 
Alguém lembra de um poema:
 
no dia seguinte ao big bang
uma dor de cabeça titânica
tomou conta dos astros que
então perceberam que era
preciso inventar algo para
prosseguir nessa luta: foi aí
que surgiram os primeiros
analgésicos que obviamente
não deram conta da ressaca
universal como tampouco
deram certo as bolsas de água
quente o omelete o banho frio
a glicose na veia e todos tiveram
que admitir que a única saída
era mesmo continuar bebendo
(Gregorio Duviviver)

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