"A NOSSA LINGUAGEM CRIA O MUNDO."

sexta-feira, 8 de junho de 2012

TRISTE ALEGRIA


O relógio marca o tempo, o tempo que a sociedade nos deu. O tempo que passa, o tempo que desperdiçamos, o tempo em que queríamos voltar, o tempo que gostaríamos de esquecer.
Tudo passa. Letícia pensava nisso a todo instante. Quando estava feliz, ficava triste, pois sabia que iria passar. Quando estava triste, ficava triste também. Ela não seguia uma lógica, isso é certo. Mas a verdade era dela, sem muita coerência.
Certa vez sua mãe disse que escolheu seu nome porque vinha do latim e significava alegria. Ela não ficou alegre em saber disso, achou incoerente, já que não sabia o que significava alegria. Uma palavra? Um instante? Uma lembrança ou uma esperança? 
Uma vez ela leu: Vende-se: sapatos de bebê, nunca usados. Tratava-se de um conto de Ernest Hemingway. Um conflito. Não era simples como parecia. Porque vendiam sapatinhos de bebê? Ninguém sabe. O bebê teria morrido antes de nascer e por isso seus sapatinhos nunca foram usados e estavam à venda?  Para que complicar? Os sapatinhos eram novos e estavam à venda em qualquer uma dessas lojas de roupas infantis.
Letícia tinha o hábito de complicar. Dessa vez ela tinha complicado bastante a sua vida. Onde estava o problema? No pior lugar possível, na sua cabeça, de lá ele não saia. Letícia não se importava em estar em uma sala escura, úmida, com fome e febre, a pior sensação era causada pelas suas lembranças.
Ela poderia ter sido feliz.
- Não seja estúpida, depois de tudo você ainda pensa que a felicidade poderia lhe pertencer? Sempre uma iludida, uma sonhadora idiota. Depois de tudo ainda consegue pensar nisso? Pensou tanto que acabou aqui em busca da tal felicidade que tanto falavam. 
Ela poderia ter encontrado um novo caminho.
- Não, você estava muito focada para pensar em seguir em frente. Você só queria permanecer parada no tempo, no tempo em que pela primeira vez entendeu o significado do seu nome.
Ela poderia ter fugido do seu destino.
- Se iludindo de novo, Letícia? Não foi destino, você planejou tudo, você contrariou a lógica. Ninguém acreditava que você conseguiria. Você conquistou e se sentiu orgulhosa. O tempo passou. Agora você está aqui, no tempo que não passa, nos dias que não mudam, sem a vida que não lhe bastou.

Abre-se a porta da cela, o guarda interrompe a conversa que Letícia tem consigo.

O julgamento começa:

 “Sou Letícia, 22 anos, solteira, ensino superior completo. Meu crime? Matei o meu amor.”

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