"A NOSSA LINGUAGEM CRIA O MUNDO."

quinta-feira, 25 de julho de 2013

O INVERNO DA TARDE


Colocou água para esquentar, com as pernas cobertas por um velho cobertor, sentindo o chão gelado, ouvindo o silêncio interior que inundava a casa, tomou seu chimarrão, era sempre a sua vez para o próximo gole. Ligou a TV e deixou em uma programação qualquer. Divagou. Lembrou-se de quando escolheu seus esconderijos e arrependeu-se de não ter guardado um amor, teve preguiça de cuidar, na impaciência juvenil não cultivou um jardim.  

A casa é triste, tanta gente por ali passou, tantas quiseram permanecer, mas ninguém vai voltar. Muita gente morreu há tanto tempo, muita gente mora longe e quem ficou por perto terminou indo também.

Nunca soube voar, desistia antes de sentir o vento, soube que muita gente conheceu as nuvens, visitou o fim do arco-íris, riu com os pássaros e pousou com os aviões. Sonhou em ir, não pode pedir para alguém ficar, acabou afastando todos e permanecendo ali.

Fez sentimentos, deixou saudade. Ah, se pudesse encontrar tudo que esqueceu de procurar. Poderia estar em lugares que não quis entrar.

Eram tantos impulsos importunos que não teve paciência para permanecer com nada, permaneceu ali. Deixou as brincadeiras pelo caminho e esqueceu do tempo que brincava de criança feliz.

A água já estava fria, a devolveu para a boca do fogão, fechou os olhos para descansar e decidiu nunca mais sentir cansaço.  

O chiado da chaleira cantava o fim daquela tarde.