"A NOSSA LINGUAGEM CRIA O MUNDO."

quarta-feira, 27 de abril de 2011

NÃO ME ABANDONE JAMAIS

 


Mark Romanek teve a feliz oportunidade de dirigir a adaptação cinematográfica “Não me Abandone Jamais”, da obra literária do autor best-seller Kasuo Ishiguro. Uma história de ficção cientifica que nos provoca maior identificação com os personagens do que de costume nas obras do gênero. Os personagens são clones que se vivessem em um futuro, distante de nós, os veríamos como robôs ou algo do gênero, mas nesse caso é diferente, os vemos como seres humanos idênticos a nós, já que vivem a nossa realidade.
Muitos questionam o fato deles serem passivos aos seus destinos, pois sabem que estão predestinados a morrer e não se revoltam contra. Porém, podemos perceber que isso funciona como uma metáfora para o que acontece conosco. Sabemos que iremos morrer, passamos a vida toda fazendo algo que um dia será interrompido.
O drama torna-se mais intenso quando achamos que o casal apaixonado deveria ter tido mais tempo junto. Mas não é o que acontece com cada um de nós? Nunca achamos que já fizemos tudo, que concluímos todos nossos objetivos e sentimos todas as emoções possíveis ao ponto de aceitar a morte.
Até aproximar-se do fim da obra, o amor é tratado como platônico. Um sentimento que sabemos que existe, mas que nenhum dos personagens luta para senti-lo por completo, já que eles têm personalidades fracas: a amiga que forma o triangulo amoroso, por insegurança, rouba o garoto que a amiga é apaixonada, imita o que vê na televisão e no outro casal de amigos; o rapaz desde menino sofre bulling, tornando-se retraído; e a garota aparentemente mais jovem, porém mais madura, não questiona nada a sua volta, inclusive quando sua amiga rouba dela o única garoto que iria amar por toda a vida.
O filme é uma obra melancólica que usa o cinza inglês para mostrar como podemos ser vazios e sem vidas, apenas esperando o dia em que o fim chegará. Só quando isso acontecer nos daremos conta do quanto podíamos ter feito, vivido e sentido. Por fraqueza, por educação, pelo modelo que sempre nos ensinaram que devíamos seguir, deixamos de realizar sonhos, viver amores, conhecer nossas almas.
Em “Não me Abandone Jamais”, cada criança é apenas mais uma com uma função prática na sociedade. Como na vida real, onde somos vistos apenas como sujeitos desempenhando funções em instituições, empregos, famílias, escolas, igrejas... Mais um entre tantos e nunca questionamos. Afinal, fomos criados para isso.


FICHA TÉCNICA


Não Me Abandone Jamais (Never Let Me Go)

Direção: Mark Romanek

Roteiro: Alex Garland

Elenco: Carey Mulligan, Andrew Garfield, Keira Knightley, Izzy Meikle-Small, Charlie Rowe, Ella Purnell, Charlotte Rampling, Sally Hawkins

Duração: 103 minutos

País: Reino Unido, EUA

domingo, 24 de abril de 2011

A GAROTA DA CAPA VERMELHA




A famosa fábula dos irmãos Grimm, Chapeuzinho Vermelho, ganha mais uma obra intertextual, A Garota da Capa Vermelha. A obra já ganha “pré-conceitos” do público, por ter como Diretora Catherine Hardwicke, a mesma que dirigiu o primeiro filme da série Crepúsculo. Mas ressalto que devemos dar uma chance à produção, que tem todo um conjunto a ser analisado, atores, fotografia, direção de arte, edição, intertextualidade, etc.
O ponto forte da história é conseguir prender o espectador no seguinte questionamento: “Quem é o lobisomem?” Alguém da vila, o vizinho, a esposa, o filho, a vovó... Será que algum ente querido terá que ser sacrificado? Será que algum dos personagens por qual criamos afeição será morto no fim da obra? Algumas pistas nos são dadas para que possamos tirar nossas conclusões, ou ainda, nos deixar com muitas duvidas, nos levando a desconfiar de todos, assim como os moradores da vila.
Para que o lobisomem seja encontrado inicia-se uma verdadeira inquisição, com direito aos mesmos julgamentos, até mesmo a “Chapeuzinho Vermelho” é apontado como bruxa e sofre os castigos impostos, apenas não é queimada, mas o fogo surge de outra forma remetendo a atrocidade cometida com as mulheres na inquisição.
Como não poderia faltar na clássica narração hollywoodiana, existe o romance. Valerie (a garota da capa vermelha) é apaixonada pelo lenhador, mas está prometida a um rapaz rico, cujo sua irmã (assassinada pelo lobisomem) era apaixonada. Porém, o rapaz rico não é uma figura esnobe ou qualquer coisa que nos dê o direito de desprezá-lo na obra, conseguindo a simpatia do público.
A Chapeuzinho Vermelho ingênua dá lugar a uma garota corajosa e sensual. Até porque uma personagem no padrão dos irmãos Grimm, nos dias atuais, não causaria identificação no público feminino levando a obra ao fracasso. A personagem feminina obediente e omissa dá espaço a forte personalidade de mulheres decididas e independentes, apontadas pela inquisição como bruxas na tentativa de calar as mulheres que lutavam por uma sociedade longe da ditadura imposta pela igreja.
Desse modo, A Garota da Capa Vermelha ganha a antipatia de muitos (aqueles que apreciam apenas vídeo arte), mas a simpatia daqueles que conseguem ter um olhar diferenciado e apontar elementos positivos de uma narrativa clássica.

FICHA TÉCNICA


Título no Brasil: A Garota da Capa Vermelha

Título Original: Red Riding Hood

País de Origem: EUA / Canadá

Gênero: Suspense

Classificação etária: 14 anos

Tempo de Duração: 100 minutos

Ano de Lançamento: 2011

Estréia no Brasil: 22/04/2011

Estúdio/Distrib.: Warner Bros.

Direção: Catherine Hardwicke

quarta-feira, 20 de abril de 2011

500 DIAS COM ELA



"500 Dias Com Ela" é uma comédia romântica, diferente dos clichês que vemos distribuídos na industria cinematografica. É suave, romântica, introspectiva, fascinante... O último adjetivo é o mais intenso, pois é por meio do fascínio que entramos na história e passamos a nos identificar com os personagens, tanto o espectador que não deseja se prender a um rótulo, chamado namoro, como Summer quanto os que como Tom sonham com um relacionamento concreto, mas o que isso significa?
O filme inicia com uma narrativa que demonstra como a personalidade dos protagonistas se constituiu. Ilustra-se a descrença da felicidade cultivada por Tom, influenciada pela triste música pop britânica e a má compreensão de um filme, representando a ação da mídia sobre os jovens e como a percepção de algo pode formar o individuo. Isso surge novamente no fim da obra, quando Tom tem um surto afirmando que os cartões, os filmes e as músicas pop são culpados pelas mentiras, pelos desgostos. Já Summer, desde a separação dos pais passa a se preocupar apenas com o cabelo, como ele é bonito e a facilidade que pode ser cortado sem que se sinta nada, uma metáfora do que ela se torna, uma mulher que tenta viver o lado bonito da vida com indiferença, ou seja, sem sentir nada.
Então, abrem-se dois quadros, mostrando Tom e Summer quando crianças, como se fossem vídeos caseiros. Nesse momento, percebemos que ambos eram igualmente alegres, sem as ideologias adquiridas com o tempo.
Tom acredita no amor à primeira vista e quando vê Summer tem a certeza de que ela é a mulher certa, aquela presenteada pelo destino. Porém, a garota nem ao menos acredita no amor, afirmando que se trata de fantasia. Ela consegue encontrar coisas melhores em ficar sozinha do que presa a uma relação. Em certo momento a garota questiona Tom, perguntando lhe o que ela estava perdendo, então ela recebe a afirmação de que saberá quando sentir. No momento ela não é convencida por ele, mas algo mudará com o tempo.
O relacionamento inicia por intermédio de Summer que se mostra mais segura e decidida do que Tom, que até então vinha sofrendo em um sentimento platônico em meio às neuroses, que apenas seus amigos eram testemunhas.
Após a primeira noite juntos, o jovem sai de casa pela manhã. A cena demonstra muito bem o aumento de auto-estima do personagem, desde a música e a movimentação de Tom, até o seu reflexo de galã no vidro de um carro. A cena transforma-se em um musical, que em seguida ganha um elemento de animação, fazendo referencia aos outros gêneros do cinema.
Porém, a diegese logo passa por uma transição, mostrando um Tom deprimido, nos dando o inicio da dicotomia que será o filme, idas e vindas, alegrias e frustrações sentimentais que ocorrem em meio aos 500 dias citados no título.
O jovem romântico é um arquiteto frustrado que não consegue atuar na área, por isso contenta-se com o emprego de escrever cartões. O olhar de arquiteto surge muitas vezes de maneira poética, por exemplo, na cena em que olhamos os prédios de baixo para cima e percebemos a beleza em praticar esse olhar. Depois vemos o lugar predileto de Tom, que é o banco de uma praça com vista para vários prédios e percebemos a beleza arquitetônica, a história, a luz, a criação. Criação esta valorizada quando ele desenha os prédios no braço da amada, nos chamando a atenção para o processo criativo.
O arquiteto consegue derrubar a parede na qual Summer se esconde, a parede da distância, do espaço, do casual... Tom estava no seu mundo. Um lugar que poucos foram convidados a ver. E lá estava Summer querendo ele e mais ninguém, mas será que era suficiente?
Os relacionamentos sem rótulos ganham espaço, levando-nos a refletir sobre qual é o verdadeiro propósito de um relacionamento, será necessário construir um nome para o que simplesmente vivemos? Namoro? O que isso significa? Apenas um conjunto de regras que passamos a cumprir severamente, cobramos e somos cobrados. Uma grande rotina que mais destrói do que faz bem.
A cena do casal no cinema e logo na seqüência o jovem sozinho no local, mostra como a vida é mutável, um dia estamos com alguém, o que não significa que amanhã as coisas serão iguais. Mas o que mais chama a atenção é a identificação de Tom com o personagem da tela, justamente o motivo pelo qual assistimos a filmes, lemos livros e analisamos a sociedade, sempre procurando uma identificação com o outro, para que possamos nos sentir menos sozinhos.
Em certo momento o protagonista nos faz o seguinte questionamento: “Já fez isso? Pensa nos momentos que já teve com alguém, repete-os na sua cabeça, várias vezes seguidas. Procura pelos primeiros sinais de problema? Ele diz que só pode haver duas opções. Ou ela é um ser humano mau, sem sentimentos e miserável, ou é um robô. Mas ele esquece da terceira opção, talvez ela não o ame o suficiente.
Tom acreditava que suas expectativas iriam se alinhar com a realidade. A crença do personagem é representada pelos quadros que são expostos, um onde as cenas ocorrem de acordo com suas expectativas e o outro com o que está acontecendo na realidade. Ao ver que Summer está noiva, então suas expectativas são quebradas, ou seja, o quadro desaparece.
Quando o jovem encontra-se no fim do poço ele é convidado a olhar a relação por outra percepção, relembrar os momentos ruins. Já que uma mesma situação pode ser vista de diversas formas, ou seja, tem uma mesma representação e distintas percepções.
A história de amor pode não ter um final feliz para eles juntos, mas ambos aprendem muito um com o outro. Summer descobre que o amor existe, ela só não havia sentido, como Tom havia lhe dito. Infelizmente, não foi com ele, como desejava. O jovem percebe que não existe destino e sim coincidência, que como o narrador nos diz, “a maioria dos dias do ano é comum. Eles começam e terminam sem nenhuma memória durável nesse tempo. A maioria dos dias não tem impacto no decorrer da vida”.

FICHA TÉCNICA


Elenco: Zooey Deschanel, Joseph Gordon-Levitt, Minka Kelly, Clark Gregg, Geoffrey Arend, Chloe Grace Moretz, Matthew Gray Gubler.

Direção: Marc Webb

Gênero: Comédia Romântica

Duração: 95 min.

Distribuidora: Fox Film

terça-feira, 12 de abril de 2011

BLUE VALENTINE – UM AMOR CONCRETIZADO



Blue Valentine é uma das atuais obras-primas da sétima arte. Guiado pela direção de Derek Cianfrance, cada cena (incluindo flashbacks) desabrocha uma reflexão, com um passo para o futuro preso ao passado que não reflete no presente, nos dando a percepção de como a relação se construiu e chegou a sua destruição.
Para que essa colocação tenha sentido para todos, vejamos como a obra trabalha em seus discursos explícitos e implícitos. Alguns pontos que devem ser analisados pelo espectador, certamente, são: o amor real, sem o ideal romântico de que o “felizes para sempre” é algo concreto; como a rotina pode desgastar o encanto de uma relação; a prisão do casamento, como se existisse uma obrigação de permanecer em certo estado, por que um dia, em outras circunstancias jurou-se amor eterno, mas como diz a música, “que seja eterno enquanto dure”; a mudança dos indivíduos, já que ninguém é imutável; como um casal deve caminhar junto, o que não acontece no filme, onde a sintonia está distorcida e ninguém consegue afinar a música que toca a todo tempo de uma maneira irritante; a visão romantizada dos jovens que mais tarde ganha lentes para o mundo real (muitas vezes, insuportável); entre outros pontos que iremos discutir.
Diante desses aspectos podemos analisar a proposta da obra em mostrar um casal real, um relacionamento em seu todo e não apenas um recorte de uma história de amor, com aqueles momentos felizes, que convêm mostrar ao espectador. O filme poderia transforma-se, facilmente, em dois. Estranho? Não. Poderíamos nos deparar com uma obra que trataria de um casal se conhecendo e se descobrindo até o dia do casamento e o “felizes para sempre”. Já o segundo filme mostraria um casal em crise, infelizes, sem forças para sair do abismo em que caíram.
Os personagens mostram suas fragilidades, sonhos e esperanças frustradas. É como se Cindy culpasse Dean por seus planos não concretizados e/ou interrompidos. A garota que sonhava ser médica, tornou-se uma enfermeira, casada com um homem que reproduz a má relação de seus pais. Ela mostra-se insatisfeita, sem nenhum vestígio do brilho, que tinha no inicio do relacionamento, ofuscado pelas responsabilidades de uma mantenedora do lar.
Dean nunca teve grandes planos, contentava-se com a vida que tinha, mas era doce, carinhoso, compreensível e fazia valer o amor que dizia sentir. Tudo perdido com o tempo. Talvez a insatisfação da mulher tenha-o feito assim, já que com a filha ele permanece o Dean com as mesmas qualidades da juventude.
A relação desde o inicio baseada no sexo, com o tempo passa a não funcionar, como todo o resto, representando o distanciamento e a dificuldade de se redescobrirem como um só.
Enfim, podemos dizer que Blue Valentine é um filme que conta a história real do amor, um amor que nasce intensamente, enche os corações de alegrias e faz que com tanta empolgação cegue o casal para o essencial. Inevitavelmente, a novidade se tornará banal e somente a compreensão, a capacidade de ceder e a vontade de permanecer unido fará com que o casal possa lembrar, saudosamente, do tempo em que tudo era sonho, já que quando passa a ser real sempre fica menos encantador. Afinal, o amor romântico existe apenas quando não concretizado.

P.S um breve resumo de uma obra que guarda muito mais subtextos do que essas palavras foram capazes de desvendar.

A fotografia funciona como uma ironia no cartaz do filme.
Ela representa a tentativa de congelar o passado, mas será possivel?

FICHA TÉCNICA


Título original: (Blue Valentine)
Lançamento: 2010 (EUA)
Direção: Derek Cianfrance
Elenco: Ryan Gosling, Michelle Williams, Faith Wladyka, John Doman.
Duração: 114 min
Gênero: Drama

domingo, 10 de abril de 2011

UM CORAÇÃO FRACO


O escritor russo Fiódor Dostoievski escreveu aos 27 anos, em 1848, a obra “A Felicidade”. Em 2011 a adaptação teatral intitulada de “Um Coração Fraco”, chega ao Festival de Curitiba e causa muitas reflexões ao público, que tem o prazer de desfrutar das alegrias e tormentas que levam o jovem Vassia a cair num verdadeiro abismo.
Dostoievski que escreverá a obra em meio ao autoritarismo do sistema Czarista, nos mostra como a obediência às regras e a simples cogitação de não poder cumprir o estabelecido pelo outro pode levar alguém ao profundo desespero destrutivo.
Vassia é um humilde jovem trabalhador, tem um amigo cuja confiança e dedicação são de profunda sinceridade, acaba de ficar noivo e já pensa em como será sua vida de casado junto ao amigo e a esposa. Porém, vendo como está feliz e que, provavelmente, esta felicidade só tende a aumentar, em uma crise de baixa-estima passa a desenvolver certo pavor em não poder fazer que todos ao seu redor cultivarem o mesmo sentimento.
Então, ele passa a querer mostrar a gratidão ao seu patrão por meio do trabalho. Mas como suas tarefas atrasaram por conta do noivado, passa a ter como único objetivo terminar seu trabalho no devido prazo, o que ele não consegue fazer.
Demonstrando sempre uma fragilidade desde física até psicológica, não resiste à pressão que ele cria para si e acaba enlouquecendo, sem que ninguém pudesse ajudá-lo, nem mesmo seu melhor amigo que tenta desesperadamente encontrar uma forma de trazer seu amigo ao estado real do mundo.
Podemos dividir a peça em duas partes: a primeira que representa a constituição da felicidade de Vassia com um tom cômico; a segunda como que a mesma felicidade abre caminho para o desespero de um homem, transformando-se em um sensível drama. O cenário e sua movimentação fazem uma parceria com o enredo, junto à iluminação, que também contribui para a construção da obra.
Procurem assistir essa peça e refletir como encaramos as felicidades e responsabilidades que a vida nos oferece. Devemos aprender a viver de maneira coerente, valorizando as coisas boas e acreditando que somos merecedores das mesmas.

FICHA TÉCNICA


Adaptação: Domingos de Oliveira

Direção: Priscilla Rozembaum

Elenco: Caio Blat, Isabel Guéron e Cadu Fávero

quarta-feira, 6 de abril de 2011

UM BEIJO ROUBADO



Um Beijo Roubado é uma produção cinematográfica do chinês Wong Kar-Wai. A obra é marcada pela cor cintilante e única, podendo ser definida como intensa. As cores funcionam bem com a noite, período em que acontece a maioria das cenas.
A personagem Elizabeth parece ser doce e sensível nas noites em que passa no café, fazendo lamentações sobre a vida e as circunstancias que a levaram até ali. Depois de muitas overdoses de torta, ela viaja em busca de uma resposta, que mais tarde encontra no mesmo lugar que deixará, já que “meio por acaso” encontra em si mesma a cura que procurava. Pois o problema nunca está em um lugar exterior, mas dentro de nós, que devemos superá-lo.
Em suas viagens e empregos vemos as experiências que todos nós temos, lugares desconhecidos, empregos que nos distraem, mas não nos pertencem, pessoas que chegam do nada e se vão da mesma maneira, frustrações, decepções, obsessões e vícios alheios que nada mudam nossa rotina, mas afetam a descoberta interior.
Apesar de estar longe da cidade de que fugirá, havia algo que a ligava ao local, alguém que a motivava escrever e mandar notícias, mesmo que nunca tenham oficializado uma amizade ou um relacionamento.
O filme aborda a diversidade de emoções e estilos de vidas, mostrando desde a história das chaves, que funciona como uma metáfora para mostrar que podemos encontrar muita coisa diferente a cada porta que abrimos, até os clientes que Elizabeth encontra durante os empregos de garçonete.
A história fica no ensaio da reflexão, como se o diretor quisesse colocar o espectador para pensar, mas quando está chegando ao ponto de interrogação prefere emendar com a resposta, empobrecendo a obra.
O filme que abriu o Festival de Cannes em 2007 passeia entre o universo Cult e Pop. O clima lento talvez faça com que a massa perca a paciência, já que está acostumada com a agilidade da narrativa clássica e os mais alternativos podem frustrar-se com a cautela existente em fazer o espectador pensar.
Embora, a obra possa parecer um pouco esquizofrênica, vale a pena assistir uma história que ilustra dois personagens fragilizados por um amor do passado, mas que buscam manter-se em pé, ao contrário dos outros personagens que abalam suas vidas, por causa de amores não resolvidos, desde do amor entre homem e mulher até o paternal. Ou seja, entre tortas de blueberries, um café e duas pessoas desiludidas, ocorre um beijo roubado que doa-se a doçura do amor.

FICHA TÉCNICA


Título original: (My Blueberry Nights)
Lançamento: 2007 (China, França, Hong Kong)
Direção: Wong Kar-Wai
Atores: Jude Law, Norah Jones, Frankie Faison, David Strathairn.
Duração: 95 min
Gênero: Drama

segunda-feira, 4 de abril de 2011

CINEMA: HISTÓRIA E INDÚSTRIA



 O cinema teve inicio na França, com a invenção dos irmãos Lumière, o cinematógrafo, em 1895, sendo mais tarde aperfeiçoado pelo ilusionista Méliès, que morreu, miseravelmente, pobre.
Inicialmente, as salas de cinema eram habitadas pela classe desfavorecida, incluindo muitos imigrantes. Porém, para que se obtivesse lucro era necessário chamar a classe alta para frente dos telões. O recurso utilizado para atrair esse público foi adaptar peças de teatro e obras literárias para o cinema, paraísos culturais exaltados pelos ricos.
No fim do século XIX formou-se um modelo de cinema inspirado no romance realista. A forma desse cinema incluía verossimilhança com a vida real, inicio, meio e fim constituíam a estrutura da obra cinematográfica, protagonistas e o detalhamento dos romances realistas se assemelhavam ao roteiro que se transformou em um livro de seqüência de cenas. Ou seja, as maneiras de narrar a literatura foram apropriadas para as telas.
O advento do longa-metragem ocorreu entre 1914 e 1915. Foi nesse período que os grandes estúdios surgiram, a linha de montagem, transformação das salas de cinema e arte em alto nível.
Os Estados Unidos cresce com a Primeira Guerra Mundial e o cinema Norte-Americano acompanha esse crescimento. Nesse período inicia-se a relação que existe até os dias atuais de arte e indústria, padrão e inovação, vinculada aos brancos, bolsa de valores e produtores executivos (que devem evitar prejuízos e fiscalizar metas na indústria cinematográfica).
Com a Era dos Estúdios (1928-1948), nos EUA, a inocência do cinema foi corrompida. Pois, os estúdios dominavam desde a produção até a exibição dos filmes, sempre pensando nos lucros. A influência dos filmes Norte-Americanos era tanta que na década de 30 as secretárias francesas fizeram uma greve, reivindicando as mesmas condições de trabalho das profissionais dos filmes americanos. Podemos classificar isso como uma colonização mental americana.
Em 1928 surge um prêmio para o cinema, conhecido como Oscar. A premiação acontece como uma jogada comercial, com regras que privilegiam o mercado Norte-Americano, que fazem com arte, porém não produzem obras primas. Já que a indústria ao contrário da arte dá a resposta ao invés de perguntar ao espectador, tornando-se pragmático. Os filmes de Hollywood são muito bons tecnicamente, eles fazem, mas não pensam.
A academia surgiu com o objetivo de ser um sindicato, mas como ele mesmo era o patrão não funcionou e para não ir a falência deixou de ser sindicato e dedicar-se somente ao prêmio.
Assim como o Oscar pertence à Hollywood o Naturalismo é a narrativa clássica Hollywoodiana. Os filmes são narrados a partir da seguinte forma: personagens bem delineados; identificação do espectador com o herói; roteiros, inicialmente, estáveis, seguido da quebra de estabilidade, luta, eliminação do problema, retorno da estabilidade, linearidade, sem ambigüidade, final feliz ou conclusivo e satisfatório, o texto ilustra a imagem, circularidade da narrativa, romance heterossexual e um pano de fundo que pode ser uma guerra, um país distante ou um ambiente de trabalho. Deste modo, a história fica tão previsível que se assistirmos o inicio e o fim da obra é possível saber o que ocorreu no meio da diegese.
Nesse contexto o espectador não questiona o que vê por vários fatores, como por exemplo, clareza, câmera estável, constituição de época perfeita, preocupação com a continuidade e os atores agem como “macacos de imitação”.
Fazendo uma linha de evolução no cinema Norte-Americano, podemos iniciar com o filme “A Felicidade não se Compra” (1946). Esse filme ilustra muito bem as regras ditadas pelo Código Hays Code, onde as obras deviam mostrar o otimismo, não podiam causar ofensas e quase sempre demonstrar que a felicidade podia ser alcançada por meio do dinheiro.
Em controvérsia com o Código o “Cidadão Keane” rompe a linearidade, a presença do dinheiro como o caminho para a felicidade, mostrando um pessimismo ao American Way of Life, estilo de vida exaltado nas outras obras. O Cidadão Keane tem um vínculo com o Expressionismo Alemão, usando o tema (pessimismo) e a estética. O filme também pertence à platéia, já que apenas o espectador fica sabendo quem é Rosebud.
Esse filme tem elementos que antecedem o Cinema Noir, que tinha características do Expressionismo Alemão, abstração, deformação, estilização e simbolismo, ao contrário da indústria que deve, obrigatoriamente, valorizar a objetividade, realismo e neutralismo.
O termo Cinema Noir foi denominado pelos franceses, que foram impedidos, pelo nazismo, de receber filmes americanos e quando, finalmente, conheceram as obras deram o nome Noir pelo fato de que as histórias lembravam muito as obras literárias de capas pretas que fazia muito sucesso na França.
O movimento Noir tem duas fases, que podemos ilustrar com os filmes Falcão Maltês (1941) – 1ª fase – Quando Fala o Coração (1945) e Crepúsculo dos Deuses (1949) – 2ª fase.
Em 1948 os estúdios perdem a estabilidade, devido ao Decreto Paramount, que proibia a participação dos mesmos na exibição dos filmes. Aproveitando a corda bamba que os estúdios percorriam os filmes independentes ganharam força. Com a Novelle Vague de 58 o diretor passa a ter sua vida refletida nas obras e não mais os estúdios produtores. Também, quem fazia cinema deixou de ser operário para tornar-se estudioso, pois surge a Universidade de Cinema.
Com a Novelle Vague o cinema passa a se referenciar, pensa-se cinema dentro da própria obra, já que ele é o tema e não mais a vida como anteriormente.
Na década de 50, para combater o surgimento da televisão, aparece o Cinema 3D nos telões.
Finalmente, em 1962, ocorre a libertação da censura, que vinha perdendo o poder de ditar suas regras. Podemos verificar isso em Psicose (1960), onde Hitchcock mostra insinuações de sexo e um banheiro que eram proibidos de aparecer pela censura, entre outros elementos que protestavam contra a ditadura da indústria cinematográfica.
Na década de 70 surgem os filmes- evento. Com o lançamento de Star Wars iniciou-se uma grande comercialização de produtos, levando a população a um verdadeiro bombardeio de mercadorias dos filmes, perdurando até os dias atuais.
O cinema que vemos nas salas de exibições da atualização são um reflexo da forma clássica hollywoodiana, para entreter o público sem correr riscos de rejeição da massa, para que assim os estúdios possam lucrar, fazendo que seus atores funcionem como mais um dos produtos lançados pela marca. Assim, os filmes feitos com arte sufocam os que são a arte e que não se tornam conhecidos pela maioria, que se contenta em assistir o “mesmo” filme toda vez que senta em frente a uma tela de cinema.